quarta-feira, janeiro 18, 2006

A subjectividade da verdade desportiva

Os dirigentes portugueses são o mais recente fenómeno da comédia em Portugal. Mas de todo esse rol, destacam-se Pinto da Costa e Luis Filipe Vieira, que têm prazer em provocar-se mutuamente. O mais recente episódio desta infindável novela escreve-se no site do Fc Porto: é, indubitavelmente, uma obra-prima, a fazer lembrar os escritos eternos de Platão.

"O que se passou no Estoril-Benfica da temporada passada tresanda a intrujice" - eis a primeira passagem a reter. Ora é óbvio que, tendo José Veiga representado o Estoril no passado, os "mais fiéis adeptos dos clubes que querem ver o Benfica acabado", vão afirmar que foi o clube da Luz que encenou tal acto, obrigando os estorilistas a "transportar" o seu palco para terras algarvias. Provas? Ninguém as deu. Ninguém deu importância ao facto da equipa da linha bater o recorde de bilheteira, angariando uns preciosos tostões para a sua sobrevivência financeira. Ninguém fez alusão ao facto de ainda faltarem alguns jogos para terminar a Superliga, e o Estoril poder garantir a manutenção em partidas mais acessíveis. A resposta mais fácil, sem pedir a ajuda do público,do telefone ou dos 50 / 50, era "Resposta C - Foi o Benfica que obrigou o Estoril a jogar no Algarve, obrigando também a sua descida de divisão."
A segunda passagem é, também ela, digna de figurar nos melhores autos de Gil Vicente: "Onde é que ficam os princípios, a transparência e a verdade desportiva quando se contrata atletas de um adversário imediato? É claro que podem jurar de forma pungente que Fonte rescindiu unilateralmente o seu vínculo com o V. Setúbal sem ser espicaçado por ninguém. Mas será que alguma alma acredita? Que atleta prefere o desemprego a um contrato de trabalho?". Ninguém fala do Standard de Liége, para onde foram um ou dois jogadores sadinos? Provavelmente, também só rescindiram porque foram obrigados a isso. Já agora, que atleta, no caso do José Fonte, prefere estar em 3 clubes diferentes, sem receber um único cêntimo, ao invés de assinar por um clube que paga os salários e promove a sua carreira? Realmente é preferível um contrato de trabalho, não remunerado.
A verdade desportiva azul e branca prende-se com acordos de cavalheiros (n.d.r. - Caso Maciel), que contornam a lei, e com lesões estranhas (n.d.r. - Bruno Vale) que impede um jogador emprestado de jogar contra o clube que detém o seu passe.
Essa visão tão verdadeira do futebol continua a avistar-se em casos como o de Duda, que se encontra em litígio com o Málaga, pois quer rumar ao Porto a custo zero, nem que para isso tenha de ficar 6 meses sem jogar. Não ouvimos o José Fonte a proferir as palavras que Duda profere há bem mais de um mês. Será que apenas Duda quer o Porto? E o inverso não se verifica?
Para culminar, a passagem mais trágica do episódio, que faz chorar os mais sensíveis: "O despudor prossegue. E, assim sendo, ano novo, procedimentos... velhos! Marcel, o melhor atleta da Académica, recusa-se a treinar e arrisca penalizações. Alguém crê que, pura e simplesmente, acordou mal disposto ou fartou-se que lhe chamassem estudante? É lógico que não! Era demasiado óbvio. Só podia ir para o Benfica. Viva a verdade desportiva!". O Benfica foi bastante claro e justo na forma como abordou o Setúbal e a Académica. Convém referir que os encarnados pagaram 1 milhão de euros por Moretto, que também ele podia ter rescindido por justa causa. Pagaram também uns bons milhares a mais aos sadinos, emprestaram Hélio Roque e Carlitos, pois julgaram que era justo, tendo em consideração a transferência a custo zero de Fonte. Quanto a Marcel... O Benfica sempre respeitou a Académica, e o próprio presidente da Briosa referiu, várias vezes, que a Académica zelaria sempre pelos seus interesses. O negócio concretizou-se, por empréstimo, e se se realizou, teve de haver acordo entre as duas partes.
O problema da verdade desportiva azul e branca é fácil de perceber: Pinto da Costa e seus súbditos julgavam ter o campeonato ganho (sonhando com os velhos tempos de Mourinho, nos quais tudo se resolvia cedo - e resolve-se ainda, mas no Chelsea), mas agora que têm alguém, que por acaso é o Benfica, a morder os calcanhares ao seu clube, disparou em várias direcções; até agora o Porto conseguia desviar todos os jogadores que os rivais da 2ª circular desejavam (Diego, Paulo Assunção, Lisandro Lopez, Adriano, entre outros), agora com Moretto e Marcel quebraram essa poderosa corrente que impedia os bons futebolistas de rumar à capital.

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