sexta-feira, março 03, 2006

Mundiais Atacantes: Brasil 1950



Depois da Guerra

Acabada a II Grande Guerra Mundial, período durante o qual as competições estiveram naturalmente “suspensas” no que diz respeito a eventos internacionais, a FIFA reúne-se em 1946, em Congresso, por forma a conceder a Organização da IV Taça do Mundo ao único país que se candidatou: o Brasil.

Inscreveram-se 33 países, que naturalmente estiveram inicialmente sujeitos a uma fase preliminar da qual saíram as 16 selecções participantes na fase final.
Devido a desistências de vária ordem, apenas 13 equipas acabariam por disputar a fase derradeira já em terras de Vera Cruz.


A selecção portuguesa mais uma vez esteve presente, participando na fase preliminar, onde numa eliminatória a duas mãos, acabaria por cair aos pés da rival Espanha, sendo derrotada em Madrid por 5-1, e obtendo um empate em Lisboa a 2 bolas. Este jogo ficou marcado por uma arbitragem tendenciosa que muito contribuiu para o apuramento espanhol, de nada valendo a força dos famosos 5 violinos. Os espanhóis apenas marcaram o golo do empate que evitou um 3º jogo, a poucos minutos do final da partida. Foi provavelmente uma das primeiras vitórias morais portuguesas…

Caminho para a Final

Abandonado o sistema de eliminação directa em pleno Mundial, decidiram-se constituir grupos de 4 equipas, por forma a apurar uma selecção por grupo, que daria um grupo final de 4 selecções que disputariam entre si o troféu.

No Grupo I, o super-favorito Brasil acabou por ser a melhor equipa, apurando-se com 2 vitórias (sobre o México 4-0 e sobre a Jugoslávia 2-0), e um empate (2-2 com a Suiça).



No Grupo II, uma surpreendente Espanha acabaria por se apurar vencendo os seus 3 encontros frente a Estados Unidos (3-1), Chile (2-0) e Inglaterra (1-0). Estes últimos acabariam por ser grande desilusão da prova ao perderem jogo com os americanos por 1-0 e depois com os espanhóis. Eles que eram os grande favoritos do grupo…

No Grupo III, depois da desistência da Argentina, apenas sobravam 3 selecções (Suécia, Itália e Paraguai), com o apuramento a ser conquistado pelos suecos, mercê de uma vitória frente aos transalpinos bicampeões do mundo em título por 3-2 e um empate com o Paraguai a duas bolas. Foi mais uma das surpresas desta competição.



No Grupo IV assistiu-se a duas desistências, pelo que o favorito Uruguai bateu sem complacências a Bolívia por 8-0, apurando-se para o grupo final… Uma injustiça, sem dúvida nenhuma.

No grupo final, na primeira jornada, um verdadeiro festival ofensivo brasileiro frente à Suécia, rendeu um resultado final de 7-1. Os brasileiros começavam a assumir-se como os grandes favoritos a conseguir pela primeira vez o título de campeão mundial. No outro jogo da mesma jornada, os espanhóis continuavam a surpreender o mundo ao conseguir empatar frente aos uruguaios por 2-2.



Chegados à 2ª jornada, a equipa azul celeste conseguia vencer os suecos por 3-2, com bastante dificuldade, enquanto que os brasileiros mostravam quem era a grande equipa do Mundial, batendo os surpreendentes espanhóis por 6-1 (!). Não havia certamente um único brasileiro no mundo inteiro que pudesse pensar que o título pudesse fugir. Bastava um empate no último jogo frente ao Uruguai para o título ser canarinho.
Na 3ª jornada os suecos acabariam por vencer a Espanha por 3-1, relegando nuestros hermanos para um injusto 4º lugar neste IV Campeonato do Mundo.

A Final



16 de Julho de 1950. Uma data que nenhum uruguaio ou brasileiro devem esquecer. Não se tratava à partida para o Mundial de existir uma “Final” tal como a conhecemos. Mas da forma como se conjugaram os resultados, o último jogo entre Brasil e Uruguai, acabou por ser a verdadeira final do Campeonato. Uma final dramática! Bastava um ponto para que a selecção anfitriã fosse campeã do mundo. Os uruguaios, uma das selecções rivais dos brasileiros (a par dos argentinos) teriam de vencer num ambiente perfeitamente hostil, perante 220.000 adeptos brasileiros completamente fanáticos. Todo o Brasil 24 horas antes do jogo já festejava a mais que provável vitória. Existiam festas preparadas, bailes, e naturalmente muito samba. Mas como todos sabemos, nunca se devem deitar foguetes antes da festa…
Oito horas antes do início do jogo já o estádio começava a receber a maré humana, para um estádio que tinha lotação prevista de 169.000, e que acabou por albergar (pela 1ª e última vez na sua vida) 220.000 pessoas (!!!!)…

A partida iniciou-se e surpreendentemente, ao contrário do que os adeptos entusiastas preconizavam, o Brasil não conseguia marcar golos no início da partida. E os uruguaios, com um futebol envolvente e assente na troca de bola ia “congelando” o adversário e a “Torcida”. Chegávamos ao intervalo com um empate a zero bolas, e com um público que começava a ficar adormecido. Psicologicamente era visível que os uruguaios conseguiam começar a superiorizar-se ao adversário e que tudo estava ainda em aberto.

Começa a 2ª parte. O Brasil tem um arranque arrasador e no primeiro minuto da etapa complementar consegue marcar o primeiro golo da partida. Explosão de alegria do Maracanã. Nada poderia tirar o título aos brasileiros!... Puro engano!...
A equipa azul-celeste mantinha a sua postura em campo, e começava a reagir, com alguma pressão sobre a defesa brasileira. Aos 67 minutos aquele que acabaria por ser considerado a figura do mundial (Schiaffino), aproveitava um deslize da defesa canarinha para igualar a partida. Faltavam 23 minutos para o Brasil conseguir o título. O público após a estupefacção inicial, voltava a apoiar a equipa, para manter preciosa “vantagem”.



E não é que aos 79 minutos de jogo, Ghiggia depois de um excelente trabalho batia o guardião Barbosa e dava a vitória aos uruguaios?... Escândalo em pleno Maracanã… O final do jogo foi absolutamente inacreditável. O Maracanã emudeceu subitamente, e aquilo que deveria ser uma festa mais parecia um velório. Os uruguaios mostraram que não há equipas imbatíveis e que contra tudo e contra todos o “sonho é que comanda a vida”. Uma verdadeira lição.

O Goleador

O melhor marcador desta edição do Mundial foi Ademir, do Brasil, com 7 golos. Apelidado de "queixada", devido ao queixo proeminente, Ademir Marques de Menezes foi um conceituado artilheiro do seu tempo. Insuperável nas arrancadas com a bola sob controle (chamadas na época de "rush"), sempre fulminantes, e capaz de concluir com os dois pés com uma imensa precisão. Artilheiro nato, raramente perdia golos em lances na pequena área.

O seu estilo de jogo deu origem à posição de “Ponta de Lança”, a sua versatilidade em actuar em qualquer posição do ataque e a sua habilidade nas arrancadas a caminho da baliza obrigou a adopção de novos sistemas de jogo pelos treinadores para o tentar suster.

Foi o grande ídolo da equipa carioca do Vasco da Gama, tendo sido por muitos anos o melhor marcador de sempre da equipa. Passou quase toda a sua carreira ao serviço desta equipa, apenas tendo jogado dois anos no Fluminense. Acabou a sua carreira em 1956.

A Figura

Juan Alberto Schiaffino é considerado por muitos como o melhor jogador uruguaio de todos os tempos. É considerado no Uruguai um herói nacional, muito devido ao seu papel fundamental na vitória sobre o Brasil em pleno Maracanã. Era um médio ofensivo com um remate poderoso e que se tornou um goleador ao longo dos anos, mesmo actuando numa posição mais recuada. Depois do sucesso que teve ao serviço do Peñarol e da selecção uruguaia, Schiaffino seria contratado pelo AC Milan, onde se tornou uma das suas maiores estrelas da década de 50, tendo mesmo conseguido obter o scudetto por 3 vezes. Acabou a sua carreira em 1962 ao serviço da Roma.


A equipa ideal

A equipa ideal de 1950 contava com Ramallets (Espanha), M. Gonzalez (Uruguai), Tejera (Uruguai), Bauer (Brasil), Varela (Uruguai), Puchades (Espanha), Ghiggia (Uruguai), Zizinho (Brasil), Ademir (Brasil), Schiaffino (Uruguai) e Gainza (Espanha).

Curiosidades Atacantes:

- A cerimónia tradicional da entrega da Taça, depois do assombro que foi a vitória uruguaia, ficou sem o protocolo previsto, uma vez que os organizadores se esqueceram das suas obrigações. Jules Rimet, sozinho, desceu ao relvado, imperturbável, entregando a Taça ao capitão da selecção do Uruguai.



- Após a desistência de algumas selecções, a organização brasileira do Mundial convidou a selecção portuguesa a participar no evento, convite que foi declinado.

- Na tentativa de encontrar um culpado para a derrota do Brasil, os superticiosos de plantão culparam a troca do local de concentração na véspera da final. O Brasil trocou a concentração de Joá pelo estádio do Vasco da Gama em São Januário. Outros culpam Flávio Costa pelas 2 horas de missa na manhã do jogo impostas pelo treinador aos jogadores, que rezaram de pé.

Resta dizer que os nossos irmãos brasileiros muito provavelmente depois desta decepção devem ter feito uma das tradicionais “mezinhas” enfeitiçando os uruguaios, uma vez que a selecção do Uruguai nunca mais chegou sequer à final de um Mundial, e além disso o Brasil já foi penta-campeão…

Voltarei na próxima semana com o Mundial de 1954.

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