segunda-feira, junho 26, 2006

Oitavos de Final: Portugal - Holanda




Mundial: Alemanha 2006
Oitavos de Final
Equipas: Portugal e Holanda
Estádio: Franken-Stadium
Cidade: Nuremberga
Árbitro: Valentim Ivanov (Rússia)
Auxiliares: Nikolay Golubev e Evgueni Volnin
Espectadores: 41000

Este foi um jogo de nervos, de sofrimento, de injustiça, de raiva, de alívio e de alegria. O futebol é isto, e é “somente” isto que faz com que haja tantos adeptos, tanta gente a viver à volta dele, tantos exageros e tanta devoção. O futebol é isto…e muito mais.
Pelo histórico de resultados entre as duas equipas, pela manutenção dos jogadores da equipa das quinas desde o recente embate no Euro 2004, com resultado favorável, e pela confiança dos jogadores portugueses, todos nós estávamos confiantes numa vitória final. Porém, existe outra equipa, e essa está remodelada com inúmeros jovens valores, com uma fase de qualificação sem derrotas, sem derrotas na fase de grupos do mundial, mesmo tendo defrontado a Argentina, com uma massa adepta em grande escala a apoiar e com o estigma de vencer os que se vão tornando nos seus “carrascos” do costume, a nossa vitória parecia reservada aos acontecimentos do jogo e algum optimismo inicial ficava esbatido na expectativa.
Portugal fez alinhar a sua melhor equipa, o seu onze titular do momento. Num habitual 4x2x3x1, Costinha compensava as subidas dos laterais, entregando a Maniche a primeira transição para o ataque, onde Deco distribuiria para Figo, Ronaldo e Pauleta. Por seu lado a Holanda actuava em 3x4x3, com Boulahrouz no lado direito na marcação a Ronaldo, fazendo subir Cocu para a distribuição de jogo, alargando o ataque com os rapidíssimos extremos, como são Robben e Van Persie. O ponta de lança, algo surpreendente, foi Kuyt, tirando a titularidade a Van Nistelroy.
A Holanda entrou com mais vigor no jogo, muito mais rápida nas suas movimentações, tentando abrir espaços na defesa portuguesa para desferir remates de fora da área ou criar espaços para o apoio dos jogadores mais atrasados.
Assim sendo, logo no primeiro minuto Van Bommel aparece em zona frontal a avisar toda a gente que o rumo dos acontecimentos passados parecia não se querer repetir. Portugal tenta equilibrar as coisas mas a Holanda parece mais decidida, mesmo com as trocas constantes entre Figo, Deco e Ronaldo. Aos 7 minutos a primeira contrariedade para Portugal, a lesão de Cristiano Ronaldo depois de falta muito dura do seu marcador directo. O árbitro foi algo condescendente e apenas mostrou o amarelo. As oportunidades para ambos os lados apareciam, mas sempre com a Holanda com mais perigo.

Até que surge o momento do golo e do jogo. Ronaldo liberta para Deco na linha que cruza para o amortecimento de Pauleta para Maniche, que trabalha primorosamente a bola e o adversário para rematar fora do alcance do gigante Van Der Sar. Estava feito o 1 a 0 e então sim, acreditava-se que era possível repetir a história recente. A resposta holandesa não demorou a notar-se, sempre com Van Persie e Robben a timoneiros. Van Persie tem mesmo a melhor oportunidade para os holandeses, quando entra na área, faz gato sapato de Nuno Valente, engana também Ricardo Carvalho e remata cruzado para fora. Uns minutos a seguir, já com Simão em campo no lugar de Ronaldo, este cruza para Pauleta receber, rodar e rematar para uma defesa apertada do guarda-redes laranja. Logo a seguir Costinha é expulso por acumulação, dando mão na bola, tendo passado incólume numa falta feita anteriormente. Quase a fazer o 2-0, Portugal acabava a 1ª parte com a perspectiva de ser massacrado na 2ª, em virtude da inferioridade numérica. Ao intervalo o seleccionador de Portugal faz a troca óbvia, tirando o elemento mais avançado, Pauleta, para fazer entrar o substituto de Costinha, Petit. Parecia não surtir efeito, já que no 1º lance de ataque, a bola sobra para Cocu que, à entrada da pequena área remata com estrondo à barra. O sufoco parecia que estava a começar. A posse de bola era o dobro para a Holanda, e Portugal só conseguia sair em contra ataque mas, mesmo assim criava perigo. Uma incursão de Miguel pela direita, dois remates de Maniche e o livre de Simão a rasar a barra punham em sentido os holandeses, que continuavam, com muito perigo, diga-se, a rematar de fora da área, exigindo muito dos defesas e do guarda-redes portugueses. A expulsão de Boulahrouz equilibrou o andamento do jogo, mas Portugal apareceu sempre em contenção de esforço, dando o domínio de jogo aos holandeses, que apareciam muitas vezes perto da área portuguesa, obrigando a um esforço estóico de toda a defensiva portuguesa. Até que o árbitro decide dar nova vantagem aos de laranja, expulsando Deco na 2ª amostragem do cartão amarelo em apenas 5 minutos. A partir daí e devido ao sobre esforço dispendido pelos portugueses, a Holanda teve 20 minutos para virar o jogo, e só não o conseguiu devido à entreajuda, à entrega e também à sorte dos portugueses. Mesmo assim, numa iniciativa individual, Tiago ia fazendo o 2-0. A expulsão de “Gio” no final da partida nada veio acrescentar. O jogo acabava com um resultado justo, premiando a equipa que mais sofreu, mais se uniu, mais sorte teve e mais importante, a única que marcou.


Maniche. Para além de ter marcado o golo da vitória, nunca deixou de rematar, e com muito perigo, de insistir, de ajudar os colegas e de fazer quilómetros naquele meio campo atrás dos adversários, adaptando-se às contrariedades dos vários momentos. A partir da expulsão de Deco a sua tarefa foi simplesmente defender, mas foi o jogador mais rematador e o mais inconformado. Sem ter feito uma exibição fenomenal, foi um jogador que cumpriu com o que era necessário. Associando esse facto ao golo da vitória e à sua entrega a escolha teria de recair sobre ele. Aliás, a Fifa também não teve dúvidas. Queria destacar aqui também a exibição do jovem talento Van Persie, mas sobretudo a exibição de mais dois jogadores portugueses: Ricardo Carvalho e Miguel. Se o segundo anulou por completo Robben, o primeiro anulou tudo o que lhe aparecia à frente, anulando inúmeras situações de golo. Nota alta também para Meira e para todos os que entraram a substituir os seus colegas.


Horrível. O russo Ivanov teve uma prestação que em nada dignificou o espectáculo. Toda a gente já constatou que as recomendações da Fifa são bem intencionadas mas exageradas, o que faz com que questionemos, e muito, da sua aplicabilidade e favorecimento neste espectáculo desportivo. Tecnicamente pareceu-me bem, mas disciplinarmente fraco. A quantidade de amarelos que exibiu ficou como “record” em fases finais de mundiais. Começou pela simples amostragem de um amarelo num lance para vermelho aos 7 minutos, passando pela expulsão de Boulahrouz num lance perfeitamente corriqueiro em futebol, perdoou o vermelho a Deco na entrada sobre Heitinga, não viu a cabeçada de Figo a Van Bommel, mostrou o segundo amarelo a Deco levando escrupulosamente à risca a recomendação sobre o atraso no reatamento do jogo, enfim, um sem número de decisões estapafúrdias que não só condicionou os jogadores e o próprio jogo, como todos os espectadores.
Embora me pareçam inoportunas, as declarações de Blatter no final do jogo, espelham o trabalho do árbitro.
Resumindo, diria que um juiz tem de fazer cumprir a lei, mas os melhores da classe são aqueles que têm a sensatez suficiente para serem justos.


A atitude inicial das duas equipas. Ambas vocacionadas para o ataque, entregaram-se por completo ao jogo e em busca do resultado mais favorável para cada uma delas. Nunca deixaram de atacar e de lutar, favorecendo o espectáculo e quem assistia. O sofrimento, a incerteza no resultado, as injustiças, as más decisões e a entrega de ambas as partes, fez com que se assistisse a um jogo electrizante, sem ser extremamente bem jogado.


A arbitragem e a falta de fair-play dos holandeses. Se da primeira já falei, a segunda foi o ponto de viragem na partida. As quezílias já vinham um pouco de trás, mas Heitinga proporcionou a gota de água. Aquando de um remate de Sneijder, Ricardo Carvalho ofereceu o corpo à bola, ficando lesionado. A bola seguiu para o ataque e, quando o árbitro se apercebeu disso parou o jogo. Ora, o fair-play impunha que a bola fosse entregue a Portugal, mas Heitinga assim não o decidiu, fazendo com que o descontentamento fosse traduzido numa falta feia de Deco que lhe poderia, por si só, ter valido a expulsão. A confusão instalou-se, o nervosismo aumentou o espectáculo nunca mais foi o mesmo.
Todos nós sabemos que o futebol é muito mais do que um jogo, mas quem não sabe perder ou ganhar não dignifica o desporto, o espectáculo e tudo mais que o futebol for.

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